Fernando Carlos Nunes de Melo Relvas e Karlos Pombo Capador Starkiller voltam a encontrar-se, mais de uma dúzia de anos depois de se terem cruzado pela primeira vez numa rua estreita do Bairro Alto.
Nessa altura, Starkiller estava de partida para o outro lado do mundo, fugido à modorra chata de Lisboa, atrás de aventuras alucinantes que iria viver na companhia de malta tão curiosa como a Olga Punk, o irmão Lince, Chiquita, o Ianqui Louco, D. Juanito e o mais coerente super-herói que me foi dado conhecer, o Capitão Latino-América.
Tal como Starkiller, também o Relvas bebia razoavelmente e tinha um relativo sucesso junto do sexo dito oposto. E a verdade é que, ao fim destes anos todos, parece que mudaram pouco: continuam a beber com dignidade e a fazer o que podem quanto ao resto.
Copo a copo, a história cresceu ao ritmo dos acontecimentos que nessa altura (meados da década de 80) animavam o dia-a-dia do mundo: guerras frias e guerras quentes, crises regulares no Médio Oriente, conflitos avulso, visitas presidenciais – o trivial. Semana após semana, as páginas do Se7e foram-se abrilhantando com os relatos do mais completo jornalista de investigação de que há memória entre nós.
Tal como acontece com os bons vinhos, as aventuras de Karlos Starkiller ganharam, com a passagem dos anos, o sabor dos clássicos que é obrigatório revisitar de tempos a tempos. Só que, ao contrário das velhas relíquias, continuam possuídas de uma tremenda actualidade, como se tivessem nascido ontem à barra do O'Gillins ou à mesa do Solar dos Galegos.
Aqui se misturam a crónica de costumes e a análise política, o non sense e a espionagem, as reflexões profundas e o mais puro divertimento, tudo acompanhado com sexo, vinho e rock'n'roll em doses proporcionais. Escritas ao ritmo da sua publicação semanal todas estas histórias reflectem a realidade circundante, nas suas diversas vertentes.
Frequentávamos, então, uma série de lugares por onde paravam algumas pessoas interessantes. Já não me lembro se o irmão Lince andava por lá, mas a Olga e a Chiquita eram praticantes, tenho a certeza. De todos esses sítios existem marcas aqui e ali, ao longo das páginas que os leitores irão ter o prazer de ler. E também das pessoas, se bem que o Relvas sempre se tenha preocupado muito mais em retratar situações do que em definir o carácter dos seus protagonistas. Afinal, como ele próprio diz, «os heróis não existem».
Não se assustem, pois, se alguma das personagens vos soar aparentada com alguém que conheçam de algum sítio menos próprio. Quem anda à chuva molha-se, não é o que diz o ditado? E o Relvas até nem usa guarda-chuva.
Prefácio a Karlos Starkiller, de Fernando Relvas | Ed. Bedeteca/Baleiazul, 1997